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Este microbook é uma resenha crítica da obra:
Disponível para: Leitura online, leitura nos nossos aplicativos móveis para iPhone/Android e envio em PDF/EPUB/MOBI para o Amazon Kindle.
ISBN: 978-65-5782-075-9
Editora: Companhia das Letras
Ao defender seu próprio legado, o patriarca Emílio Odebrecht descreveu os números que entregaria ao seu filho (ou, como se dizia na organização, à terceira geração). Após superar algumas crises, Pedro Novis, presidente da empresa de 2002 a 2009, a colocou nos trilhos.
Isto é, os lucros passaram de R$ 8 bilhões para mais de R$ 40 bilhões em sua gestão, passando de 28 mil para 82 mil colaboradores. O ano de 2008, por exemplo, foi encerrado com operações ativas em 7 países, em um ritmo de crescimento acelerado pelo chamado “boom” das commodities.
Naquele ano, o barril do petróleo chegara ao maior valor registrado: US$ 147. Tamanha alta turbinou as receitas da Odebrecht, pois, mais de 60% de suas obras estavam em curso, justamente, em países produtores, como Brasil, Angola e Venezuela. Nesse contexto, o controle do grupo foi passado para Marcelo.
Durante o período da ditadura, nunca ficou provado que o favorecimento recebido pela Odebrecht se fundamentava em trocas de propinas ou se foi motivado exclusivamente por interesse político.
Seja como for, o apoio político recebido pelos militares e pelo ex-governador e deputado Antônio Carlos Magalhães (ACM) rendeu excelentes dividendos à organização, mas, também, escândalos internacionais.
Os discípulos do patriarca original, Norberto Odebrecht, pai de Emílio e fundador da construtora, constataram, do pior modo, a impossibilidade de entrar na lama com um terno branco e sair limpo depois.
Norberto não poderia prever, nos longínquos anos de 1970, o quão longe sua organização chegaria. Com efeito, ela se tornou um conglomerado de 30 empresas e 43 mil trabalhadores, espalhados por 12 países.
Em seu auge, faturava quase US$ 3 bilhões anuais, com cerca de 20% vindos do exterior. Emílio coroou, com suas iniciativas e ideias, a estratégia consagrada pelo pai, embasada em 2 princípios fundamentais: manter os segredos e nunca ficar longe do poder governamental, independentemente do grupo político que o excercesse.
Segundo a autora, a experiência adquirida por Emílio à frente do grupo o ensinou que ser apenas “gostável” ou fazer parte da dita “elite do empresariado” não o isentaria das denúncias de corrupção e, muito menos, das ações da Operação Lava Jato.
O que ele não dizia publicamente, contudo, era que os financiamentos para esses empreendimentos sempre vinham dos bancos estatais brasileiros ou do próprio Tesouro Nacional.
Gaspar apresenta o ex-presidente da República, Luiz Inácio da Silva, o Lula, como um “novo amigo” do grupo Odebrecht. Todavia, o presidente, ao concorrer para o seu primeiro mandato, continuava gerando arrepios nos representantes do mercado financeiro.
Consequentemente, a Bolsa caiu, o preço do dólar subiu e os petistas compreenderam que, para não morrerem na praia, era necessário evitar embates com o mercado.
Nesse cenário, surgiu a ideia de redigir uma declaração que pudesse acalmar os financistas e empresários em geral. Emílio Odebrecht fez questão de contribuir. A célebre “Carta ao povo brasileiro” serviu para que Lula prometesse respeitar os contratos, promover uma transição “lúcida e criteriosa”, e dialogar com todos.
Ainda mais importante: o documento garantia a estabilidade nas contas públicas, o superávit fiscal e um combate intransigente à inflação. Ao lado das intenções mais genéricas, um elemento indicava, em particular, a influência da Odebrecht, expressa na criação da SECE (Secretaria Extraordinária de Comércio Exterior).
O órgão estaria diretamente ligado ao presidente. A organização se interessava muito por essa pasta, uma vez que facilitaria os financiamentos à exportação de serviços e às obras de infraestrutura.
Apesar da reação desconfiada dos investidores e financistas, a carta foi razoavelmente bem recebida pelos industriais. Afinal, estes apreciaram a ênfase na reforma tributária e na produção manufatureira.
O ex-presidente Fernando Henrique, FHC, não era uma unidade na organização, embora seja reconhecido como o responsável pela aproximação de Hugo Chávez, ex-presidente venezuelano, com a empreiteira
Muitos consideravam que FHC não defendia os interesses do empresariado brasileiro no exterior, especialmente, os da Odebrecht. Internamente, referiam-se a Cardoso como “ingrato” e “malandro”, por usufruir da ajuda do grupo quando necessário e sair pela tangente sempre que precisava defendê-lo mais energicamente.
Essa espécie de “má vontade” justificava-se pela influência de liberais ortodoxos no governo FHC, que atuavam para reduzir os subsídios estatais. Dentre as diversas batalhas travadas com o Palácio do Planalto, uma das mais marcantes se deu em função de um subsídio considerado vital para a Odebrecht.
O CCR (Convênio de pagamentos e Créditos Recíprocos) consistia em um aval que os Tesouros Nacionais dos países da América Latina ofereciam às suas empresas, de modo a estimulá-las a venderem os seus serviços pelo subcontinente.
Caso uma companhia brasileira, por esse convênio, celebrasse um contrato para vender ou construir, por exemplo, na República Dominicana ou na Venezuela, e algum desses governos desse calote, o Brasil cobriria os rombos e, posteriormente, cobraria os prejuízos da nação devedora.
Agora que chegamos à metade da leitura, vamos nos aprofundar nos aspectos mais relevantes da narrativa de Malu Gaspar.
Nos anos recentes, o acordo de confidencialidade celebrado mediante a Odebrecht e a força-tarefa da Lava Jato, foi comemorado internamente, pois muitos integrantes do grupo o consideraram uma “vitória”.
Com efeito, o documento era mais que uma espécie de armistício: colocava o grupo na primeira fila dos delatores, uma vez que, até aquele momento, outras 5 construtoras lutavam por finalizar um acordo vantajoso com o Ministério Público (MP).
Os embates e as tensões estavam longe do fim. Contudo, ao menos agora, desde o ponto de vista dos executivos do grupo, as sextas-feiras voltaram a evocar somente os bem-vindos fins de semana, em vez de temerem o dia preferencial de apreensões da Polícia Federal.
Com a celebração do acordo, montaram um grupo no app de mensagens Telegram chamado de “Interlocução MPF/Odebrecht”. Entre eles, a negociação passou a ser batizada de “A mesa”.
Na Odebrecht, o clima se transformou com o andamento da delação. O décimo quinto andar de sua sede que, antes, era um dos mais calmos de todo o prédio (ocupado, normalmente, por escritórios da presidência, alguns vices, além de salas de reuniões) se transformou, de acordo com Gaspar, em uma “verdadeira fábrica de confissões”.
As salas de reuniões foram convertidas rapidamente em ambientes laborais com pilhas de papéis e computadores. Nelas, os potenciais delatores eram entrevistados e propostas de anexos eram redigidas freneticamente.
Cerca de 30 advogados circulavam diariamente por esses locais, bem como funcionários, diretores e executivos. Para os procuradores, um delator devia ter cumprido, pelo menos, dois de três itens: operacionalizar pagamentos, negociá-los ou aprová-los.
A partir desses critérios, chegaram a 200 candidatos a delatores, que iam sendo convocados para oitivas à medida que novos casos eram esmiuçados. Em um corredor, composto por 3 salas dotadas de acesso biométrico, havia computadores que permitiam consultas ao sistema Drousys (voltado ao registro de codinomes e à troca de mensagens).
A despeito do acordo firmado com a Polícia Federal, a organização estava escaldada, logo, temia novas ofensivas sobre arquivos secretos que, na prática, eram os elementos mais importantes da colaboração.
Avisos ostensivos de acesso privado ao departamento jurídico foram colocados em algumas salas, pois a Odebrecht se valia de uma decisão judicial que proibia ações de busca e/ou apreensão contra os advogados dos réus.
Na época da divulgação, pela imprensa, das confissões dos líderes empresariais da Odebrecht, ninguém poderia prever os seus efeitos. Certamente, todos sabiam que eles não seriam brandos.
Haviam sido distribuídos, só no exterior, US$ 439 milhões em propinas. Entre os setenta e sete delatores, 14 viviam em outros países. O grupo tinha importantes ativos a preservar fora do Brasil e decidiu começar a vendê-los.
Alguns executivos sugeriram assinar um acordo exclusivo com suíços e brasileiros, abrindo novas rodadas de negociações com os estadunidenses, a fim de obter sigilo. A motivação implícita era aproveitar esse tempo para fechar a venda de alguns ativos.
Caso a divulgação das delações fosse desastrosa, não assinar um acordo com a PF poderia ser perigoso. De fato, sem fechar um acordo com a justiça dos Estados Unidos, não seria possível assegurar que os negócios permaneceriam incólumes ou que os executivos mantivessem a liberdade.
Tal decisão só poderia recair, dada a sua importância, sobre o próprio Emílio Odebrecht, que a tomou no último minuto.
Um dos objetivos que Marcelo Odebrecht traçou consistia em colocar no epicentro dos escândalos envolvendo a companhia todos os que, em sua visão, se omitiram das responsabilidades devidas.
Isso incluía seu sucessor, o seu cunhado e, até mesmo, seu pai. Ele tinha uma justificativa e estímulos bastante consistentes: a promessa de, caso melhorasse sua delação, o sistema judiciário o progrediria mais cedo para o regime semiaberto.
A partir desse instante, ativou sua poderosa arma: uma cópia do disco rígido de seu notebook, contendo mais de 70 mil documentos, 230 mil anexos e 480 mil mensagens de e-mail que registravam, pormenorizadamente, sua gestão na Odebrecht.
Foi a própria força-tarefa da Lava Jato que o entregou todo esse material, para que ele pudesse realizar pesquisas e, assim, completar suas delações – desde que o conteúdo fosse mantido em sigilo. Com esse arsenal, Marcelo podia fustigar seus inimigos.
Na prisão, sem recursos e solitário, Marcelo concentrou toda sua energia em travar um duro embate contra a Odebrecht e o pai. Tal obsessão era interrompida, apenas, pelas horas dedicadas à avaliação de planilhas dos custos da repartição em que passou a trabalhar, uma vez a cada semana, e os inúmeros depoimentos prestados à justiça.
Sua prodigiosa disciplina, memória e disposição para escrever mensagens longas continuavam as mesmas. Essas qualidades o ajudaram a preencher os arquivos de processos contra a organização, na mesma velocidade com que, outrora, ele rodava os gabinetes em Brasília, impondo sua vontade e poder.
O homem que já foi um dos mais poderosos empresários da América Latina, tratado com deferência por mandatários e políticos de todo o continente, agora se consome em dívidas e processos.
No último trimestre de 2020, a Odebrecht tinha 13 empresas em fase de “recuperação judicial”. Além da construtora, agora rebatizada como “Oec”, havia 6 outras que não gozam desse status, tais como a Ocyan (antiga “Odebrecht Óleo e Gás") e a Braskem.
O grupo empregava cerca de 34 mil trabalhadores, distribuídos em 10 países. No ano anterior, lucrou R$ 78 bilhões. Desse montante, quase 80% foi obtido pela Braskem. Pelo acordo judicial, a petroquímica deve destinar apenas 20% de seus dividendos aos acionistas. O restante deve ser entregue aos credores.
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Gaspar é uma jornalista de grande renome em todo o Brasil. Ela atua na revista Piauí, mas t... (Leia mais)
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